Os analgésicos, como são conhecidos atualmente, também trilharam um longo e tortuoso caminho.
A busca por analgesia remonta à Pré-História. Em desenhos encontrados em sítios arqueológicos é possível ver os primeiros humanos tratando suas dores com emplastos ou cataplasmas (THOM, 1958).
O primeiro registro de tentativas de analgesia com elementos da natureza vem dos Sumérios. Aproximadamente cinco mil anos antes de Cristo, os sacerdotes tratavam os pacientes em nome do deus Ormuz (THOM, 1958). Escritos em caracteres cuneifórmicos em pranchas de argila (tablitas sumérias) ensinavam como cultivar o ópio, mas não aparece menção de uso do alcaloide em qualquer tipo de tratamento, no entanto, os historiadores deduzem tratar-se de uma descrição prévia de como obter a droga para aplicar nos doentes (BROWNSTEIN, 1993).
Por volta do ano 1.500 a.C., os egípcios descreveram, no Papiro de Ebers, as propriedades da casca do salgueiro no controle da dor e da febre (BROWNSTEIN, 1993).
Os gregos mais antigos, por volta do ano 800 a.C., empregavam o ópio tanto com fins terapêuticos quanto recreacionais. Na Odisséia de Homero, o guerreiro Telêmaco usa o ópio para esquecer suas aflições (BROWNSTEIN, 1993).
Quatrocentos anos depois, ainda na Grécia, Hipócrates de Cós usou o pó das cascas de salgueiro no tratamento de vários tipos de dores, incluindo a cefaleia (BROWNSTEIN, 1993).
Na oitava década da era cristã, o grego Pedanyus Dioscorydes escreveu uma coletânea de cinco volumes sobre tratamento de doenças com elementos da natureza, incluindo a casca do salgueiro. Sua obra chamou-se de Pharmacopea e foi recompilada diversas vezes em grego, latim e árabe (BROWNSTEIN, 1993).
Após um longo período de desuso, o ópio retornou à terapêutica na Europa pelas mãos de Paracelso (BROWNSTEIN, 1993). Paracelso, ou Phillipus Aureulus Theophratus Bombastus Von Hohelnehm, seu nome de batismo, era médico e alquimista.
Após muitas experiências frustradas e percebendo que a crença e a busca da pedra filosofal, do elixir da longa vida e do solvente universal pelos alquimistas ortodoxos não levaria a lugar algum, enunciou uma frase que o tornou célebre, além de transformá-lo em persona non grata pelos mais radicais. “Apenas os idiotas pensam que a alquimia é o conhecimento de como obter ouro. O objetivo da alquimia é procurar descobrir novos remédios”.
Disse isso e fugiu da cidade, como aconteceria inúmeras vezes em sua vida, pois despertou a ira não apenas dos alquimistas ortodoxos, mas também dos charlatões que usavam dos conhecimentos roubados dos alquimistas para enganar os cidadãos de boa fé, obtendo dinheiro e vantagens.
Por conta de suas convicções, Paracelso acabou assassinado em 1521 por sicários a mando de seus inimigos. O mérito de Paracelso foi romper com toda a crença medieval que impedia o desenvolvimento das ciências, descobrir novos compostos e deixar seguidores, os Iatroquímicos, que continuaram sua obra (CARVALHO, 1924).
Thomas Sydenham, também conhecido como o “Hipócrates Inglês”, em 1660, introduziu o laudano como um tratamento para alívio eficaz da dor (BROWNSTEIN, 1993).
O capelão inglês Edward Stone, em 1763, recomendava o uso de pó da casca do salgueiro como uma alternativa mais barata ao pó da casca da quina peruana no tratamento da malária (BROWNSTEIN, 1993).
Em 1804, Friedrich Serturner isolou a principal fração do ópio e deu-lhe o nome de morfina. Essa descoberta marcou o nascimento da indústria farmacêutica (BROWNSTEIN, 1993).
O cientista italiano Raffaele Piriá desenvolveu juntamente com outros pesquisadores, , em 1838, um método de extração de um composto ácido presente na casca do salgueiro – o ácido salicílico, também chamado de salicina (BROWNSTEIN, 1993).
Por volta de 1886, uma tentativa de tratar vermes intestinais levou à descoberta da acetanilida, um derivado da anilina, corante utilizado em tingimento de tecidos. A acetanilida tinha uma ação antipirética poderosa e passou a ser comercializada com o nome de Antifebrina, sendo um grande sucesso de vendas (BROWNSTEIN, 1993). A acetanilida é precursora das sulfas e do paracetamol (KOROLKOVAS, 2008).
Com o sucesso da antifebrina, muitas empresas especializadas na fabricação de tinturas para tecidos passaram a direcionar suas pesquisas rumo à obtenção de novos compostos farmacoterapèuticos com atividade maior, visando, logicamente, ao lucro (BROWNSTEIN, 1993).
Em 1887, o fabricante de tinturas Friedrech Bayer & Co. lançou a fenacetina no mercado, um antipirético mais efetivo que a antifebrina e com menores efeitos secundários. A fenacetina tornou-se o fármaco mais utilizado no tratamento da cefaleia (BROWNSTEIN, 1993). Após o grande sucesso da fenacetina, Friedrech Bayer & Co., que produzia tinta para tecidos, passou a fabricar medicamentos (CARVALHO, 1924; BUDAVAVI, 1996).
Em 1893, o fisiologista alemão Joseph von Mering, testou o Paracetamol, que apesar de ser menos efetivo que a fenacetina, acabou tomando o seu lugar (BROWNSTEIN, 1993), sendo consumido indiscriminadamente nos dias atuais (KATZUNG, 2009).
Em 1897, pesquisadores da Bayer sintetizaram o ácido acetilsalicílico. Este novo fármaco, com efeitos secundários menores do que o ácido salicílico ou que o pó da casca do salgueiro, tornou-se outro sucesso de vendas e foi patenteado com o nome de Aspirina (BROWNSTEIN, 1993). O ácido acetilsalicílico é obtido por simples esterificação a quente do ácido salicílico com o ácido acético (ou anidrido acético) em meio ácido (KOROLKOVAS, 2008).
Ainda em 1897, os mesmos pesquisadores que desenvolveram a Aspirina criaram a Heroína, que foi comercializada como isenta de precipitação de dependência do tipo morfínico até 1910, quando diversas pesquisas estabeleceram o potencial maior de dependência da Heroína em relação à morfina (BROWNSTEIN, 1993).
No início do século XX, Sigmund Freud introduziu a cocaína no tratamento da depressão e de diversos tipos de dores. Ele mesmo usava a droga. Esta é a grande mancha que acompanha Freud, pois a cocaína hoje é droga proscrita e proibida em praticamente todos os continentes (SOLOMON, 1972; KOLB, 1980).
No século XX surgiram praticamente todos os fármacos analgésicos e antipiréticos usados hoje. A partir da década de 1940, apareceram diversos derivados da morfina, como, por exemplo, a petidina, a nalbufina, o tramadol, o dexpropoxifeno, a metadona e a oxicodona. A grande maioria dos anti-inflamatórios esteroidais (AIEs) e não esteroidais (AINEs), empregados atualmente, também surgiu no século passado (BROWNSTEIN, 1993).
Transcrito da dissertação de Mestrado em Medicina – Clínica Cirúrgica defendida por Vladimir Antonini.
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