O exame ginecológico da criança e da adolescente obedece aos mesmos tempos daquele praticado na mulher adulta. Alguns aspectos especiais, porém, se fazem presentes e serão ressaltados aqui. Cumpre assinalar que nem sempre é possível completar o exame ginecológico na primeira consulta. É importante que o examinador compreenda o temor da paciente jovem com relação ao exame dos órgãos genitais. É preciso, de início, captar a confiança da cliente, aliviando sua tensão emocional, para completar o exame em consultas subseqüentes.
1. Anamnese
1.1. Identificação
Devem ser registrados: nome, idade, cor, nacionalidade e procedência da cliente. Nome e endereço dos pais ou responsáveis pela cliente devem, também, ser registrados. Admitamos que a puberdade começa aos nove anos e termina aos dezesseis, podendo ser dividida em dois períodos distintos: pré-manárquico e pós-menárquico. A menarca, fenômeno central da puberdade, ocorre, mais freqüentemente, entre 12 e 14 anos.
1.2. Queixa e história de doença atual
Estes tópicos podem ser abordados em conjunto porque os antecedentes são, em geral, de curta duração. Os motivos de consulta citados a seguir são os mais comuns.
Corrimento é a queixa freqüente de crianças e de adolescentes.
Alterações do aspecto dos órgãos genitais externos, tais como hipertrofia do clitóris, posição anômala do meato uretral, assimetria das ninfas (pequenos lábios) e imperfuração himenal levam crianças ao exame.
Alterações do ciclo menstrual são referidas pelas pacientes logo após a menarca: ora as menstruações são profusas e com intervalos encurtados, ora são escassas e de longos intervalos.
O aparecimento dos caracteres sexuais secundários pode ser precoce, ocorrendo na infância e também pode não haver ocorrido em meninas de 14 anos.
Traumatismos sobre o aparelho genital são comuns nos pronto-socorros onde se atendem vítimas de acidentes ou de estupro.
1.3. antecedentes familiares
Condições de saúde dos pais e de pessoas que convivem com a paciente, podem estar relacionados com a queixa atual. É de interesse averiguar detalhes sobre a evolução da gravidez que gerou a cliente; as queixas que a mãe possa apresentar, relacionadas com seu aparelho genital; o estado mental dos irmãos; e a possível existência de casos de intersexo na família.
1.4. Antecedentes pessoais
É importante saber se o nascimento da paciente decorreu de parto normal ou cesáreo, de evolução curta ou longa. Traumas encefálicos ocorridos no parto são responsáveis por distúrbios do desenvolvimento e do ciclo menstrual. As condições de vida (habitações coletivas, promiscuidade, etc.), interferem nos hábitos de higiene e precisam ser apurados.
1.5. Antecedentes menstruais
Este aspecto está relacionado à idade da paciente. Perdas sangüíneas antes dos nove anos podem significar precocidade sexual. A data da menarca e os caracteres dos ciclos menstruais (intervalo, duração e quantidade) devem ser anotados. A interpretação destes caracteres se expõe nos tópicos referentes à disfunção menstrual. Registram-se, ainda, a data em que ocorreu a última menstruação e a eventual presença de dor menstrual. A cólica menstrual é, em geral, indicativa de ovulação.
1.6. Antecedentes sexuais
Algumas adolescentes podem referir contatos sexuais, embora apresentem hímen íntegro. Em outras, pelo exame, constata-se ruptura da membrana. Na primeira hipótese, é preciso estar prevenido quanto a alusões que refletem, apenas, a capacidade imaginativa das pacientes. Perguntas a respeito de atividade sexual devem ser formuladas com muita discrição e naturalidade para que a jovem se sinta à vontade e revele episódios de sua vida íntima. O assunto deve ser abordado no momento em que o examinador e a paciente possam dialogar sem a presença de outras pessoas. Recomenda-se que a enfermeira esteja presente, no mesmo recinto, permanecendo, no entanto, a certa distância e aparentando não participar do assunto. O eventual uso de anticoncepcionais será assinalado neste tópico.
1.7. Antecedentes obstétricos
Não são comuns os casos de meninas que hajam engravidado antes dos 16 anos. No caso de surgirem referências a respeito, precisamos saber detalhes sobre a evolução da gravidez, do parto e do puerpério. As adolescentes podem recorrer à prática de abortamentos em condições precárias de assepsia. As conseqüências são, algumas vezes, de alta gravidade, pela instalação do abdome agudo infeccioso.
1.8. Corrimento
É freqüente a queixa de corrimento na infância e na adolescência. Este sintoma decorre de vulvite, vaginite ou cervicite e suas características dependem do agente etiológico como será especificado na seção correspondente.
1.9. Sintomas mamários
O desenvolvimento mamário é uma das primeiras manifestações de aparecimento dos caracteres sexuais secundários. Algumas alterações podem surgir no decorrer: assimetria, hipertrofia bilateral, hipotrofia bilateral e nódulos.
1.10. Interrogatório sobre os diversos aparelhos
Na infância e na adolescência, o funcionamento de certos órgãos e sintomas pode repercutir no aparelho genital. A anamnese fornecerá dados importantes sobre a inter-relação referida.
1.10.1. sistema nervoso: está intimamente relacionado com o sistema glandular; doenças do sistema nervoso repercutem no desenvolvimento corporal e nos caracteres do ciclo menstrual.
1.10.2. sistema glandular: tireóide, fígado e supra-renais interferem no metabolismo dos esteróides sexuais.
1.10.3. sistema respiratório: casos de vulvo-vaginite precedem ou são concomitantes com faringites e tráqueo-bronquite. As bactérias responsáveis são as mesmas e as mãos podem ser os veículos de contaminação.
1.10.4. Sistema digestivo: enterocolite crônica e infestações ano-retais podem causar, respectivamente, dor pélvica e leucorréia.
1.10.5. Sistema urinário: é freqüente a coexistência de malformações dos aparelhos genital e urinário. Em relação aos processos inflamatórios, cistite e vulvo-vaginite comumente se associam.
2. Exame físico geral
Deve ser avaliado, de início, o estado geral da paciente. A seguir, são avaliados a pele, as mucosas, os pelos, o panículo adiposo e os sistema muscular e ósseo. Registra-se a altura, o peso, a temperatura axilar, o pulso e a pressão arterial.
3. Exame ginecológico
O exame ginecológico se constitui dos seguintes tempos obrigatórios:
3.1 Exame das mamas
3.2 Exame do abdome
3.3 Exame dos órgãos genitais externos
3.4 Exame dos órgãos genitais internos
3.5 Vaginoscopia.
A execução dos tempos constantes dos itens 3.1, 3.2 e 3.3 não difere da adotada para o exame da mulher adulta.
Devido à integridade himenal, o toque retal é empregado freqüentemente, para exame dos genitais internos. Nas crianças, é difícil executar o toque retal sem o auxílio de anestesia. Nas adolescentes, é possível fazê-lo com mais facilidade, contando-se com a colaboração das pacientes. O toque retal possibilita a exploração do útero e dos anexos.
A vaginoscopia pode ser realizada utilizando-se o colpovirgoscópio idealizado por Bicalho.
Este recurso propedêutico não requer anestesia, pode ser aplicado no próprio consultório e permite o exame das paredes vaginais e da portio.
Vaginoscopia em criança de 7 anos
Outro aparelho que se destina ao mesmo fim é o espéculo de virgem.
Vaginoscopia em criança com espéculo de vírgens
Sua colocação exige que a paciente esteja sob anestesia geral, que propicia relaxamento das estruturas do assoalho pélvico. Através do espéculo de virgem, podem ser realizados: biópsia do colo e curetagem uterina.
[Voltar]