As grandes companhias de Internet, com o apoio dos Estados Unidos, conseguiram na semana passada muito do que queriam: grande número de países se recusou a assinar um tratado mundial que, na opinião dos contrários, poderia causar maior controle governamental sobre o conteúdo online e as telecomunicação.
Os Estados Unidos assumiram uma clara posição de defesa à Internet livre –segundo autoridades do país e líderes setoriais– ao recusar até mesmo referências mínimas à Internet na revisão do tratado da União Internacional de Telecomunicações (UIT) e ao convencer dezenas de países a seguir no mesmo caminho.
Mas tanto os profissionais de tecnologia quanto os políticos temem que a Internet continue sob risco de novos controles impostos por diversos países, e alguns deles dizem que a divisão só se agravou durante a conferência de 12 dias da UIT em Dubai e pode acelerar o fim da atual forma da Internet.
“Se a comunidade internacional não consegue chegar a acordo sobre um tratado relativamente simples de telecomunicações, existe o risco de que se desmantele o consenso que existiu até agora sobre a governança pela Icann (que controla o sistema de endereços da Web)”, disse um delegado europeu à Reuters.
“Alguns países claramente pensam que é hora de reconsiderar todo o sistema, e as disputas quanto a isso podem se provar infrutíferas”, acrescentou.
Há cada vez mais países preocupados com os crimes internacionais cibernéticos e o uso por dissidentes de serviços como o Twitter e Facebook, que não estão sujeitos ao controle de autoridades nacionais de telecomunicações.
Muita gente esperava que a UIT fosse o foro adequado para determinar padrões ou pelo menos trocar ideias sobre como enfrentar esses problemas, mas a recusa dos EUA de assinar o tratado pode ter servido para convencer algumas nações de que terão de agir por conta própria, afirmaram alguns delegados.
“Isso pode resultar em fragmentação da Internet porque cada país terá posição própria sobre como lidar com as organizações transnacionais e regulamentará a Internet de maneira diferente”, disse outro delegado europeu, que anonimato.
Sem a cooperação dos EUA e da Europa, “no futuro talvez tenhamos uma Internet fragmentada”, disse o diretor da divisão internacional do Ministério das Telecomunicações e Comunicações de Massa da Rússia, Andrey Mukhanov.
Linha dura na negociação
Com incentivo do Google e outros gigantes do setor, os norte-americanos adotaram uma posição firme contra uma aliança de países que desejavam o direito de saber mais sobre o roteamento de tráfego da Internet e as identidades dos usuários –entre eles a Rússia– e contra países em desenvolvimento que desejavam que os fornecedores de conteúdo pagassem por pelo menos parte dos custos de transmissão.
O Ocidente conseguiu angariar apoio contra a participação da UIT no controle da Internet de um número de países superior ao esperado pelos dirigentes da organização, deixando apenas 89 dos 144 países participantes da conferência dispostos a assinar o tratado de imediato.
Esses países também apoiam uma resolução não compulsória no sentido de que a UIT tenha um papel na regulamentação da Internet, em companhia dos governos nacionais e de organizações do setor privado.
Alguns delegados acusaram os norte-americanos de planejar a rejeição de qualquer tratado e de terem negociado sob falsos pretextos. “Os EUA tinham o plano de diluir ao máximo qualquer que fosse o texto negociado e depois não assinar”, disse o segundo dos delegados europeus.
Outros delegados aliados dos EUA e o porta-voz oficial dos norte-americanos negam firmemente a alegação. “Os EUA mantiveram uma posição firme e coerente”, disse o porta-voz. “No fim das negociações, e só no final, ficou claro que o texto proposto não satisfaria nossas condições”.
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