De acordo com o Dr. Arnaldo Zubioli, no Brasil a instalação de uma farmácia é livre e pode ser aberta em qualquer localidade, independente do número de farmácias existentes e da população a ser atendida. Os critérios que regem a abertura de uma farmácia são meramente comerciais, prescindindo, na maioria das vezes, do farmacêutico, que só é convocado para atender as exigências da lei.
No nosso País a propriedade da farmácia não é reconhecida como um direito do farmacêutico, a não ser por um pequeno período de nossa história, mas que teve vida efêmera, sucumbindo aos interesses do poder econômico.
A Lei 5.991, de 17 de dezembro de 1973, regulamentada pelo Decreto 74.170, de 10 de junho de 1974, que dispõe sobre o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, é equivocada, uma vez que sustenta a ideologia que entende saúde como mercadoria que se compra atrás de um balcão de farmácia e que o melhor profissional é aquele que consegue indicar maior número de medicamentos, vender mais e te mais lucro.
A Lei 5.991 facilita a ação de aventureiros que queiram exercer a profissão farmacêutica, propiciando o licenciamento de práticos através da ingerência política.
A Lei 5.991/73 concedeu favores legais a práticos para o exercício da farmácia pública, pela sétima vez em cem anos de República, conforme ordem de seqüência:
a) aos que já possuíam farmácias antes de 30.12.1921 e que já tinham ou adquiriram o título estadual de oficial de farmácia, nos termos do Artigo 9.º do Decreto n.º 20.877;
b) aos que possuíam farmácia antes de 30.12.1928 e que já tinham, ou adquiriram posteriormente, o título estadual de oficial de farmácia, nos termos do Decreto n.º 20.877;
c) aos que possuíam farmácia em pleno funcionamento em 19.01.1931 – Decreto 20.377 – Artigo 9.º;
d) aos que possuíssem farmácia pública onde não houvesse outra legalmente estabelecida num raio de 12 km, observadas as condições de requerimentos à autoridade sanitária e satisfeitos os requisitos de publicidade prévia fixados no Decreto 20.877;
c) aos que, tendo o título de oficial de farmácia pelos menos há 5 anos, se estabeleceram com farmácia em localidade sem assistência farmacêutica – Lei 1.472/51;
f) aos que, tendo o título de oficial de farmácia há 6 anos, possuíam farmácia há 10 anos, antes da vigência da Lei n.º 3.820/60;
g) finalmente, aos que, tendo o título de oficial de farmácia, provarem a propriedade ou co-propriedade de farmácia em 11 de novembro de 1960, antes da vigência da Lei n.º 5.991/73.
A farmácia, por razões históricas, tem sido vítima de tentativas seguidas de provisionamento, sofrendo investidas sistemáticas e organizadas que poderão acabar de uma vez com a sua organização no país. É lamentável constatar este fato em um país carente de recursos humanos na área de saúde. Esta situação espelha a falsidade dos seguidos Governos do Brasil que a despeito de dar prioridade à saúde e à educação no país, vedam os olhos como a deusa Themis, para não ver o mar de corrupção passiva que campeou livremente durante o período republicano. O provisionamento de leigos para atividade que põe em risco a saúde das pessoas é um sintoma evidente de subdesenvolvimento cultural.
A legislação farmacêutica sempre foi feita à revelia dos farmacêuticos, apenas para atender interesses políticos e demagógicos dos proprietários de farmácia, relegando a um plano secundário a saúde da população. Lamentavelmente, o CFF e os Conselhos Regionais sequer são ouvidos quando se trata de estabelecer as leis que regem a farmácia pública (comercial).
Porém, o fato é que um Estado como o Paraná, com 8.500.000 habitantes, tem uma farmácia para cada 3.646 habitantes. Em Curitiba, a relação é de uma farmácia para cada 2.752 habitantes. No Estado de São Paulo há uma farmácia para cada 3.570 habitantes e na cidade de São Paulo a relação de proporcionalidade é de 1:3.470. Sem comentar que há localidades com 1.500 habitantes e 3 farmácias em funcionamento.
Este quadro é agravado pelo fato de que o Brasil tem mais de 40.000 farmacêuticos. Considerando que o país tem 46 cursos de farmácia que oferecem 4.059 vagas anuais para a formação de farmacêuticos e tendo em mente que 12.180 estudantes estão prestes a entrar no mercado de trabalho, a questão do exercício profissional e o problema da farmácia pública (comercial) complicam-se consideravelmente.
A ausência de limitação do número de farmácias pela distância e pela população, agravada por uma margem de lucro das mais reduzidas entre os países do mundo, é um quadro desalentador para a atual situação da farmácia brasileira.
O que nos permite concluir que as autoridades deste país nos últimos cinqüenta anos delinearam e seguiram, em relação à farmácia, uma política irrealista e incoerente.
Por uma lado, quiseram ou consentiram que se instalassem farmácias em números superior às reais necessidades do país, sobretudo nos grandes centros. E isto, porque demagogicamente quiseram fazer com que a defesa da saúde pública se confundisse com uma farmácia em cada esquina, ou porque, pura e simplesmente, não souberam adotar a tempo uma política realista e coerente.
Por outro lado, elaboravam-se leis apenas com o objetivo de agradar os proprietários de farmácias, que nada mais são do que comerciantes, uma vez que eles se opõem aos farmacêuticos por razão de cultura, de educação e de sistemas.
Assim, não foi bastante ter-se determinado no Brasil que o farmacêutico deve estar presente na farmácia durante todo o tempo em que esta estiver aberta ao público.
Faltou aos farmacêuticos a necessária liberdade para poderem exercer a profissão, respeitando as disposições que a lei e a deontologia impõem. A única medida cabível é que as farmácias sejam obrigatoriamente propriedade de farmacêuticos. Esta medida é necessária (haja visto o que se passa no mundo civilizado), mas não suficiente. Tem que estar acompanhada de outras medidas específicas, como a viabilidade econômica do empreendimento farmacêutico, uma vez que é flagrante a diferença da situação econômica dos países nominados anteriormente.
Não é nossa intenção esgotar o assunto a respeito das peculiaridades da situação do controle da venda e da distribuição de medicamentos no mundo. Os exemplos colocados falam por si e demonstraram a seriedade com que é encarada a questão das farmácias em alguns países do mundo. A diferença com os exemplos existentes no Brasil é abissal!
[Voltar]
Sou farmacêutica e responsável pela Vigilância Sanitária de São João del Rei.
Hoje pesquisando sobre farmácias para preparar um encontro com farmacêuticos e proprietarios de drogarias na cidade na tentativa de minimizar alguns problemas, esbarrei no seu artigo achei muito interessante. Infelizmente, a situação tem se agravado porque muitas ações de fiscalização no sentido de que a legislação seja cumprida, tem originado ações na justiça com obtenção de inacreditáveis liminares que ferem o direito do cidadão de ter acesso a produtos com a segurança necessária. Exemplo nacional tem sido o embate jurídico de algumas associações de farmácia e a ANVISA pelo não cumprimento da nova legislação do setor. Enquanto isso, vamos tentando nos manter otimistas de que um dia o Brasil será um país que trata as questões de saúde com mais responsabilidade e, realmente, por todos!
Saudações!
Patricia Torga:
Se não fosse a ganância desenfreada e o desrespeito com saúde, os Farmacêuticos poderiam fazer muito mais que os médicos ou qualquer outro profissional da saúde em prol do cidadão. Lamentavelmente vivemos em um país onde hipócritas e gananciosos tomaram o poder informal, sustentados pelo dinheiro, mandando e desmandando neste país, alheios às leis e aos interesses do cidadão.