Todo mundo conhece Hipócrates (460-370 a.C.). Isso por causa do Juramento, que poucos médicos sabem de cor, ou lembram, a não ser a proibição de fazer sexo com as pacientes. Os Preceitos que adornam o Juramento advertem os praticantes da medicina contra cobrar demais, vestir-se com elegância excessiva e usar perfume, ao mesmo tempo aconselhando um corte de cabelo decente e unhas aparadas, encorajando a suposição de um modo agradável de tratar os pacientes (a expressão em inglês, bedside manner, nos foi legada pelo Punch, em 1884).
Como Watt inventou o motor a vapor, Hipócrates inventou a medicina clínica. É um mecanismo simples, a aplicação prática da observação inteligente. O que importa é o homem doente, não as teorias do homem sobre a doença. E o paciente todo deve merecer atenção, bem como o ambiente que o cerca – medicina holística que foi moda há 21 séculos.
Primeiro Hipócrates:
- Ele encostava o ouvido no peito para ouvir a fricção das membranas inflamadas, nos casos de pleurisma, que sovama como couro novo.
- Ele notou o nariz aguçado, os olhos fundo, as orelhas frias da face próxima da morte, a facies hipocratica, usada por Falstaff em Henrique V, quando seu nariz ficou agudo como uma pena e com o “balbúcio de campos verdes”.
- Ele meditou sobre a respiração estranha de um homem agonizante, desde o caso de “Filisco, que vivia ao lado do muro e caiu de cama no primeiro dia de febre aguda… mais ou menos no meio do sexto dia, ele morreu. A respiração era o tempo todo como a de um homem tentando refazer de um esforço, e espaçada e profunda”.Esses famosos últimos suspiros ressurgiram em 1818 em Dublin, John Cheyne (1777-1836) descreveu um caso de apoplexia. “Durante vários dias sua respiração foi irregular, parava completamente por um quarto de minuto, então começara muito fraca, depois gradualmente ficava pesada e rápida e, aos poucos, parava outra vez. Essa revolução no estado da sua respiração durava mais ou menos um minuto.” Vinte e oito anos depois, Willian Stokes (1804-1878) despertou novamente a atenção dos médicos de Dublin, os nomes desses dois escoceses émigrés foram para sempre ligados ao termo respiração “Cheyne-Stoking” – uma deficiência no centro respiratório do cérebro – que fazia os médicos balançarem a cabeça, o anúncio certo do fim.
- Hipócrates descobriu que o alcatrão (um anti-séptico) detinha a supuração dos ferimentos. Ele retirava o pus, alinhava fraturas e corrigia deslocamentos da coluna.
- Ele estabeleceu o princípio: “Nossa natureza é o médico das nossas doenças”. O que significa que a maioria das pessoas melhora, de um modo ou de outro.
Hipócrates nasceu na ilha grega de Cós, na costa da Turquia e ensinava sob um olmo (digno de ser visto por turistas). Ele nos deu a palabra “aforismo”. Ele criou 412 aforismos, tais como:
- A vida é curta, a arte é longa.” Uma frase deprimente, gravada nas entradas das escolas de medicina.
- A oportunidade é passageira, a experiência perigosa, o julgamento difícil. O mesmo que a primeira.
- Casos desesperados precisam de remédios desesperados.
- Os velhos suportam melhor o jejum, depois os de meia-idade, os jovens suportam mal e as crianças pior do que todos. Daí a fortuna representada por livros com dietas para a meia-idade).
- Não julgue as fezes por sua quantidade, mas por sua qualidade. “Duas vezes em volta do recipiente e pontiaguda nas duas extremidades”, era o que um velho médico rural considerava erradamente o perfeito.
- O sono que põe fim ao delírio é bom, sono fora de hora é sonolência indicam doença, bem como o cansaço sem motivo.
- Os velhos ficam doentes com menor frequência que os jovens, mas levam suas doenças para o túmulo.
- A morte súbita é mais comum no gordo do que no magro.
- Se uma mulher saudável pára de menstruar e sente enjôo, está grávida. Nós todos sabemos estas coisas. Mas Hipócrates foi o primeiro a saber).
O “Pai da Medicina” foi um ancestral desastroso. Ele nos deixou a tradição hipocrática. Ou seja: qualquer leigo que diga a um médico como fazer seu trabalho está cometendo uma impertinência ultrajante. Qualquer interferência nos meios que contribuem para a devoção desinteressada de qualquer médico aos seus pacientes é chocantemente imoral.
Hipócrates teria se admirado com a declaração de Platão de que ele era a Autoridade de Saúde na Área de Cós. O próprio Marco Aurélio teria hesitado em descer do Capitólio para dizer a Galeno que seu orçamento ia ser cortado. Eheu fugaces! No fim do século XX, a medicina proliferou tanto e seu custo cresceu tanto, que um tratamento adequado está muito além dos meios dos sofredores assustados e, no futuro, está além dos meios de qualquer cidadão sofredor e pagador de impostos. A não ser que os remédios aprendam a praticar economia, além de medicina, Hipócrates se tornará redundante, porque ninguém mais poderá se dar ao luxo de ficar doente.
Hipócrates brilha elegantemente na galeria de e estátuas antigas dos homens de medicina, com chuva sua barba crespa e testa franzida para os males da humanidade (pode ser vista do Museu Britânico). Frequentemente eles está usando o cajado de Esculápio, o Deus da cura, com serpente enrolada. Na desordem e confusão do Olimpo, Esculápio era filho de Apolo (médico dos deuses) de Coronis (ninfa). Ele era tão bom na sua profissão que enfureceu Plutão, por diminuir a população do Hades, o rei dos infernos o explodiu com um relâmpago. Ele pode ser visto na Tate Gallery, no quadro de Sir Edward Pointer , de 1880, que representa clínica de Esculápio: um jardim murado com fontes cantantes e o arrulho das pombas, as pacientes, quatro mulheres voluptuosas, completamente nuas, bem providas de seios e de mons veneris, sendo bom unico sofredor um homem, que mostra ao médico o calcanhar dolorido do pré esquerdo. Homem de sorte, o velho Esculápio.
Hipócrates escreveu seis livros, embora fosse tão plausível a ideia de atribuir a sua obra a várias pessoas quanto dizer isso de Shakespeare.
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