Governo do Rio usará canais e riachos como redes de esgoto; especialistas criticam medida

Poupem os protestos, Srs. Especialistas e Ecologistas. O (dês)governo carioca, como qualquer outro, está apenas oficializando o emporcalhamento ambiental.

Rafaella Javoski*
Do UOL Notícias
No Rio de Janeiro

Devido à falta de rede de saneamento básico em comunidades de maior aglomeração na cidade, como as favelas, o governo do Rio de Janeiro anunciou que vai priorizar investimentos em um sistema conhecido como saneamento de tempo seco. Em vez de construir as tubulações do saneamento convencional, o governo vai jogar o esgoto em canais e riachos destas comunidades e bombeá-lo para pequenas estações de tratamento nas localidades. O nome “tempo seco” refere-se à impossibilidade de usar o sistema em dias de chuva, pois com o aumento do volume de água, o esgoto transbordaria.

Segundo nota da Secretaria do Ambiente, “a tecnologia possibilita uma melhora na qualidade da água de lagoas, baías e praias”. A secretária estadual do Ambiente, Marilene Ramos, anunciou que o Estado vai espalhar captações pelos rios e canais que desembocam nas lagoas da Barra e de Jacarepaguá. Estão previstas intervenções nos canais das Taxas e do Cortado, no Arroio Pavuna e no rio do Anil. Serão projetadas captações no entorno da Baía de Guanabara – em Itaboraí, São Gonçalo, Caxias e Nova Iguaçu. A previsão é que o Estado entregue as captações de tempo seco em cerca de um ano e meio.

Especialistas ouvidos pelo UOL criticaram a iniciativa do Estado. O engenheiro químico Gandhi Giordano acredita que a captação de tempo seco é uma alternativa “completamente equivocada”. Para ele, a saída é a urbanização das favelas e a instalação de um sistema de esgoto formal. “Isso é para aumentar estatística e a taxa de esgoto coletado. Não vai resolver nada. Nós pagamos caro, é para fazer tratamento bem feito”, queixou-se.

A geógrafa Ana Lúcia Nogueira Brito alega que a prioridade do governo e da Secretaria do Ambiente deveria ser a recuperação de estações de tratamento que já existem, mas não operam. Segundo Brito, há três delas no município de Belford Roxo, na Baixada Fluminense. “Não é melhor colocar essas para funcionar?”, questiona. Ela repreende ainda a falta de três itens: projetos das estações de tratamento dos rios; recursos para construir e a garantia de que a Cedae (Companhia de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro) vai assumir o compromisso. “A Cedae não opera as que existem hoje de maneira adequada. Essa é uma solução temporária e precária”, criticou a geógrafa.

Já o doutor em Oceanografia Química e professor da UFF (Universidade Federal Fluminense), Júlio César Wasserman, concorda parcialmente com o sistema. “Não é a solução ideal, mas é melhor que não ter tratamento nenhum”, defende. Para Wasserman, a melhor solução seria a canalização do esgoto em toda a cidade e o professor culpa os políticos pela ausência desse sistema. “O cano fica embaixo da terra, o eleitor não vê, ele não pode inaugurar e não ganha voto. O prejuízo é muito maior que uma rua não asfaltada, mas essa aparece”.

A Secretaria do Ambiente afirma que o projeto é considerado uma solução emergencial para melhorar a qualidade da água a tempo de realizar os Jogos Olímpicos de 2016. E admite que “o novo saneamento não pode ser considerado solução final para o tratamento de esgoto, e sim complementar, à espera da instalação futura de uma rede de esgoto”.

Em entrevista ao “O Globo”, a secretária Marilene Ramos afirmou que o Estado terá uma verba de cerca de R$ 100 milhões no ano que vem para realizar obras de saneamento convencional. “Investiremos, sim, em sistemas de tempo seco, mas sem esquecer do convencional, que separa o esgoto da galeria pluvial”, disse. O UOL não conseguiu localizar a secretária para comentar o assunto.

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* Colaborou o UOL Notícias, em São Paulo