Portugal

Em Portugal, desde 1521, quando D. Manoel instituiu o “Regimento do Físico-Mor do Reino”, que é o primeiro texto legislativo farmacêutico, estabeleceu-se o princípio de que apenas os farmacêuticos, então chamados “boticários”, poderiam “assentar” botica, ou seja, ser proprietários de farmácia, após exame de conhecimento realizado por um júri constituído pelo Físico-Mor, pelos físicos da Corte e pelos boticários do Rei e da Rainha.

A necessidade de firmar as bases científicas da atividade farmacêutica levou o Rei D. Sebastião a criar na Universidade de Coimbra, a Faculdade de Botica. Posteriormente foram criadas as faculdades de Lisboa e do Porto. Hoje estas três faculdades formam alunos em Ciências Farmacêuticas num curso de cinco anos (cinco anos de faculdade e seis meses de estágio). As alterações curriculares criaram as seguintes opções no curso de farmácia – Farmácia Pública (Comercial) e Hospitalar, Farmácia Industrial e Análises Clínicas.

Esta disposição de reservar a prática da profissão farmacêutica exclusivamente aos indivíduos titulares para a exercerem continua em vigor até hoje, passando por diversas disposições legislativas situadas na mesma linha, como foi o Decreto n.º 9.431, de 16 de fevereiro de 1924, era que o Governo da 1.ª República resolveu exigir a direção das farmácias por farmacêuticos por reconhecer que se encontrava “O exercício da profissão farmacêutica eivado de tais abusos e irregularidades tão atentatórias da saúde pública como dos interesses legítimos que reclamações instantes têm sido subido aos poderes públicos para que ponha cobro aos desmandos cometidos.”

Seguiu-se o Decreto n.º 13.470, de 12 de abril de 1927, o qual dispõe expressamente no seu artigo 4.º que “nenhuma farmácia ou laboratório de produtos farmacêuticos poderá estabelecer-se, depois da publicação da presente lei, sem que o farmacêutico que a ela presida seja seu proprietário ou co-participante da empresa que explora o estabelecimento.”

Esta situação desemboca em 20 de março de 1965 na Lei n.º 2.125 e, em 1968, no Decreto-Lei n.º 48.547, fiéis ao princípio da indivisibilidade da propriedade e da direção técnica da farmácia portuguesa.

A Lei n.º 2.125 foi completada com a Lei do Exército da Farmácia, com normas mais rígidas no tocante à direção técnica.

A reserva do acesso à propriedade das farmácias para os farmacêuticos e o princípio da indivisibilidade da propriedade e da direção técnica da farmácia decorrem fundamentalmente dos números 1 e 2 da base II e do número 1 da base IV da Lei 2.125, que transcrevemos na íntegra:

“Base II – 1 – As farmácias só poderão funcionar mediante alvará passado pela Direção-Geral da Saúde. O alvará é pessoal, só pode ser concedido a quem é permitido ser proprietário de farmácia e caduca em todos os casos de transmissão, salvo nas hipóteses previstas na lei. 2 – O alvará apenas poderá ser concedido a farmacêuticos ou a sociedade em nome coletivo ou por quotas, se todos os sócios forem farmacêuticos e enquanto o forem.

Base IV – 1 – Se a farmácia integrada na herança ou nos bens do casal vier a ser adjudicada a cônjuge ou herdeiro legitimário que não seja farmacêutico ou aluno de farmácia, deverá, no prazo de 2 anos, ser objeto de trespasse ou de cessão de exploração a favor de farmacêutico, sob pena de caducidade do alvará.

Este prazo conta-se da abertura da herança, salvo se houver inventário obrigatório.

Se o adjudicatário não for cônjuge ou herdeiro legitimário, a farmácia deverá ser trespassada em igual prazo, sob a mesma cominação.”

E é nesse sentido que Diogo Freitas do Amaral nos ensina quando diz que:

“O objetivo primário da lei é, claramente, a proteção da saúde pública. Ao diferenciar os farmacêuticos habilitados dos restantes cidadãos no tocante à aquisição e transmissão do direito de propriedade sobre as farmácias, o legislador considera, pois, que o farmacêutico proprietário dispõe, de condições ímpares para prosseguir a sua actividade – de interesse público – sem pressões potencialmente conflitantes com a deontologia própria de tal actividade profissional; e que, por outro lado, a proteção da saúde pública impõe que se adoptem providências legislativas tendentes a assegurar tais condições.”

Cerca de cinco mil farmacêuticos trabalham em Portugal. A maioria (2.500) em farmácia pública (comercial), em torno de mil são analistas clínicos, quatrocentos trabalham na indústria farmacêutica, duzentos em farmácia hospitalar e os restantes em diferentes atividades como o ensino, a investigação, indústria alimentar, laboratórios de toxicologia, etc.

Portanto, em Portugal, há várias décadas decidiu-se que só os farmacêuticos poderiam ser proprietários de farmácias e que estas funcionariam sob a responsabilidade e com a assistência assídua e permanente do farmacêutico diretor-técnico.

Também em Portugal optou-se pela limitação do número de farmácias, inicialmente só pela distância (300 m de distância mínima), posteriormente pela população. Porém, o fato é que para um país com 10 milhões de habitantes há 2.500 farmácias, portanto cerca de 4.000 habitantes/farmácia, o que quer dizer que a limitação só pela distância foi insuficiente e a limitação pela população chegou tarde.

Para tanto o Ministério da Saúde de Portugal elaborou a Portaria n.º 806, de 22 de setembro de 1987, regulamentando o regime de abertura e transferência de farmácia e que tem as seguintes características: a) a instalação de novas farmácias pertence não aos farmacêuticos, mas ao Ministério da Saúde; b) os interesses particulares de candidatos farmacêuticos a novas farmácias cedem, assim lugar a critérios de interesse coletivo no domínio da saúde pública; c) dá-se prioridade às transferências sobre as instalações de farmácias; d) submeter a concurso, a atribuição de alvarás de farmácia, estabelecendo-se com rigor os critérios de seleção de farmacêuticos candidatos; e) a instalação de novas farmácias não será inferior a 6.000 habitantes/farmácias e que não haja estabelecimento a menos de 300 m.

A Lei n.º 2.125/65 não permite que o farmacêutico seja proprietário de mais de uma farmácia; mesmo numa sociedade de dois, três ou mais farmacêuticos, não poderá ser proprietário de mais de uma farmácia no conjunto.

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