Anna Freud

ANNA FREUD (1895-1982) era a mais nova dos seis filhos de Freud e um dia escreveu que não teria nascido se alguma forma segura de contracepção estivesse estado disponível aos seus pais. Freud anunciou o seu nascimento, recebido mais com resignação do que com alegria, numa carta a um amigo, comentando que teria dado a notícia por telegrama se o bebê fosse menino (Young-Bruehl, 1988). Mas o ano do nascimento de Anna, 1895, foi talvez simbólico – ou profético – porque coincidiu com o nascimento da psicanálise e porque Anna seria a única filha a seguir os passos do pai e tornar-se analista.

Esse desfecho não correspondia aos desejos de Freud. Ele esperava que Anna se casasse e tivesse filhos, tendo resistido à idéia de que seguisse a carreira psicanalítica. No final, contudo, ele cedeu. “O que eu podia fazer?”, disse ele. “Ela era minha filha” (New York Times, 12 de novembro de 1985). Assim, aos quatorze anos, Anna Freud se sentava discretamente num canto nas reuniões da Sociedade Psicanalítica de Viena, absorvendo tudo o que era dito.

Aos vinte e dois, movida pelo seu forte apego emocional ao pai e por suas preocupações com o que Freud denominou “sua sexualidade”, Anna foi fazer análise com ele. Cinco anos depois, ela leu seu primeiro artigo acadêmico perante a Sociedade Psicanalítica de Viena. Intitulado “Fantasias e Devaneios de Espancamento”, ele supostamente se baseava numa história de caso de um paciente anônimo. (Na verdade, tratava-se de suas próprias fantasias; ela ainda não começara a tratar pacientes). O artigo descrevia sonhos de um relacionamento amoroso e incestuoso entre pai e filha, uma surra e a gratificação através da masturbação. O artigo foi bem recebido por Freud e seus colegas e valeu a Anna sua admissão na Sociedade.

Três anos depois, ela publicou seu primeiro livro, Introdução à Técnica da Análise Infantil (1927), que indicou a direção dos seus interesses. Ali apresentava uma abordagem de terapia psicanalítica com crianças que considerava sua relativa imaturidade e seu baixo nível de habilidade verbal. Suas inovações incluem o uso de materiais para brincar e a observação da criança em casa. A maior parte de seu trabalho foi feita em Londres, onde a família de Freud se instalou depois de fugir dos nazistas em 1938. Ela abriu uma clínica na casa vizinha àquela onde Freud morreu, tratando de pacientes e instalando ali um cento de treinamento psicanalítico onde muitos psicólogos clínicos americanos estudaram. Sua obra foi registrada em volumes anuais de The Psychoanalytic Study of the Child (O Estudo Psicanalítico da Criança), que começou a ser publicado em 1945.

Anna Freud também deu substancial contribuição à revisão da posição teórica ortodoxa do pai, ampliando o papel do ego em seu funcionamento independente do id. Em o Ego e os Mecanismos de Defesa (1936), ela desenvolveu e esclareceu as concepções freudianas sobre o uso dos mecanismos de defesa para proteger o ego da ansiedade. O que veio a ser a relação-padrão de mecanismos de defesa freudianos, foi na realidade trabalho de Anna Freud. Ela os definiu mais claramente e forneceu exemplos com base em sua análise de crianças.

A psicologia do ego, tal como desenvolvida por Anna Freud e outros, tornou-se a forma americana primordial de psicanálise entre a década de 40 e o começo dos 70. esses neo-freudianos se empenharam em tornar a psicanálise “parte da psicologia científica. Eles o ficaram traduzindo, simplificando e definindo em termos operacionais noções freudianas, estimulando a investigação experimental de hipóteses psicanalíticas e alterando a psicoterapia psicanalítica” (Steele, 1985b, p.222). Com isso, promoveram uma aproximação entre a psicanálise e a psicologia experimental acadêmica.

Outra tentativa de modificar a psicanálise freudiana é a teoria das relações objetais, que também se desenvolveu na Inglaterra. Essa abordagem tem como foco a intensa relação emocional que se desenvolve entre o bebê e a mãe. Ela descreve esse vínculo em termos sociais e cognitivos, e não em termos exclusivamente sexuais. O relacionamento bebê-mãe é estudado mediante a observação direta dos bebês, e não pedindo a pacientes adultos que reconstruam sua primeiras experiências infantis em história de caso.

Os neo-freudianos ainda se identificam, de modo geral, com freudianos. esse rótulo não pode ser aplicado aos dissidentes e descendentes, para os quais nos voltamos agora.

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