Enquanto Pasteur era responsável por uma onda de entusiasmo nas Universidades européias, entre os anos 1860 e 1870, o recém formado Heinrich Hermann Robert Koch (Clausthal, 11 de dezembro de 1843 — Baden-Baden, 27 de maio de 1910) estava fora desse mundo científico. Andava à cavalo à noite pelas estradas da Prússia (atualmente parte integrante da República Federal da Alemanha), para atender às mulheres de fazendeiros que davam à luz. Era um mero médico de província, que, para se casar com Emmy Freatz, pusera de lado a ambição de ter uma vida de aventuras, longe dali.
Quando fez 28 anos, sua mulher, economizando sobre as despesas do armazém, presenteou-o com um lindo aparelho – um microscópio. Sentia que o marido sacrificara, por ela seus sonhos juvenis e que se aborrecia com o “blefe profissional da medicina” (A expressão aqui utilizada e colocada em negrito e itálico foi retirada da bibliografia consultada e transcrita em sua íntegra. Referência número 01), como chamava sua prática clínica e profissional. Com esse aparelho, Koch revolucionaria a ciência e teria aventuras bem mais compensadoras do que teria tido no Taiti ou na Amazônia.
Ao ler alguns trabalhos de Pasteur, ficou interessadíssimo pelo carbúnculo e ao examinar o sangue enegrecido de animais mortos por este microrganismo, constatou que ali havia uma enormidade de filamentos ou bastonetes soltos. Então, num laboratório improvisado, infetou ratos com sangue contaminado e neles apareceram os bastonetes. “São seres vivos”, imaginou Koch. Tentou várias provas, sem êxito. Um dia, colocou o humor vítreo de um olho de vaca sobre uma lâmina esterilizada e introduziu um fragmento infetado do baço de um rato. Cobriu-a com outra lâmina de vidro côncava, untada de vaselina, virou o conjunto de cabeça para baixo e obteve uma gota pendente, aprisionada em uma bolsa estéril. Conseguira a primeira cultura de microrganismos, inovando a técnica bacteriológica. Koch ficou 50 minutos de olho fixo no microscópio, e então os bastonetes começaram a se multiplicar. Estavam vivos!
Durante oito dias, cultivou gerações e gerações sucessivas de bacilos. Depois voltou a inoculá-los nos ratos, e eles morriam de carbúnculo com o sangue negro fervilhando de bastonetes. Antes de qualquer outro, esse médico de roça que se desprendeu dos dogmas e mecanicismos da medicina e resolveu pesquisar com o espírito dos grandes alquimistas e farmacêuticos, provara que uma determinada espécie de micróbio causa uma espécie definida de doença. Com 34 anos de idade, ainda desconhecido, Koch embarcou para Breslau. Seu velho mestre Cohn auxiliou-o a fazer demonstrações que duraram três dias. Quando terminou, estava consagrado. 1880: o Governo chama-o para Berlim e oferece-lhe um belo laboratório. Já por essa época todos os médicos da Europa só discutiam bacteriologia. Apareceram mil teorias, uma mais maluca que a outra. Mas a criatividade de Koch venceu a batalha. Junto com a Dra Hesse, inventou a cultura sólida de ágar-ágar e outros métodos até hoje usados.
Enquanto seus assistentes procuravam os agentes da difteria e da febre tifóide, Koch se dedicava à tuberculose. Mas nos tecidos doentes nada aparecia. Com infinita paciência, Koch aplicou-lhes um corante, que fez aparecer em azul, bacilos muito pequenos e finíssimos. Conseguiu isolá-los e inoculá-los em animais sadios que contraíram a tuberculose.
Pouco antes, Pasteur afirmara que em breve estaria provada a origem microbiana da moléstia e contra ele levantara-se toda classe médica de Paris, liderada pelo Dr. Pidoux, que afirmara: “A tuberculose é única e múltipla ao mesmo tempo. Sua terminação consiste na destruição infetante e necrobiótica do tecido plasmático de um órgão, processando-se por diversos caminhos que o higienista e o médico devem esforçar-se por dominar”. Exemplo de palavrório sem sentido. No dia 24 de março de 1882, Koch anunciava sua descoberta: o bacilo causador da tuberculose, hoje designado por Micobacterium tuberculosis, um bacilo Álcool-ácido-resistente (BAAR), universalmente conhecido e consagrado com o nome de Bacilo de Koch.
Em 1883, a cólera asiática bateu às portas da Europa. Procedente da Índia, onde era endêmica, atingiu e devastou Alexandria, no Egito. Koch foi para lá com seus colaboradores, e Pasteur mandou dois assistentes. Um deles, o Dr. Thuillier, morreu durante as pesquisas, atacado da moléstia. Koch, ao depositar flores sobre sua sepultura, disse: “Elas são muito simples, mas são de louros como as que dão aos bravos”(referindo-se às flores). A seguir, foi à Índia estudar o mal mais de perto e, em 1884, tendo vivido entre os infelizes coléricos indianos, isolou o germe da cólera, um vibrião em forma de vírgula, e demonstrou como era transmitido.
Foi nessa época que Pettenkofer realizou a bravata que o tornou célebre, ao referir-se aos meios de cultura em forma de caldo contendo vibriões: “Então o senhor garante que esse caldo de bacilos me matará se eu o tomar?” Perguntando e girando entre os dedos um tubo de ensaio contendo um caldo amarelo. O Dr. Koch respondeu muito sério: a dose contida no tubo era suficiente para matar de cólera meio batalhão de granadeiros. E então, para o espanto dos membros da Academia Imperial de Medicina, em Berlim, onde a cena se desenrolava, o Professor Pettenkofer tomou um pequeno pedaço de pão que levava consigo, derramou-lhe por cima o caldo do tubo e comeu.
“Pois lhe garanto, caro Dr. Koch, que vou até engordar com estes inofensivos bacilos”, riu Pettenkofer. “Os bacilos não causam doença nenhuma. Pega-se uma doença porque se está predisposto a ela. Os bacilos nada têm a ver com isso”.
O fato é que Pettenkofer nunca pegou cólera, nem demonstrou sintoma algum da doença. E, sempre que se encontrava com Koch, arreliava-o de bom humor: “Muito bons seus bacilos, Dr. Koch. Ótimos para o chá das cinco com torradas”.
A corajosa (ou inconsciente) demonstração de Pettenkofer convenceu muita gente de que os bacilos não tinham nada a ver com a causa da cólera. Com seu riso irônico e bem-humorado, Pettenkofer ia e vinha entre os médicos, dizendo “Ora, os bacilos”. E sua boa saúde testemunhava por ele. Mas o fato é que ele não tinha razão: Koch fizera uma descoberta fundamental na história das ciências da saúde. Apenas, como se demonstraria depois, nem todas as pessoas são sensíveis a qualquer doença, a qualquer hora. Existem resistências naturais e adquiridas por imunização, que defendem as pessoas dos microscópicos e onipresentes causadores das moléstias e Pettenkofer era resistente ao bacilo da cólera. A história se encarregou de provar que este estava enganado, apesar de sua coragem. Coragem que não era, não é, e jamais será rara entre os cientistas. Vários deles se auto-inocularam para provar suas hipóteses, e muitos morreram nos anos heróicos da bacteriologia.
Em 1890, Koch pensou ter realizado a mais importante descoberta de sua vida: a tuberculina, substância para curar a tuberculose. Seu grande prestígio lhe valeu crédito imediato. Assim, a substância foi fabricada e aplicada com muitas esperanças, pois nesse tempo a tuberculose literalmente devastava a Europa. Mas a tuberculina foi um fracasso como remédio. Serviu apenas para criar um teste hoje conhecido como Reação de Mantoux (o nome de seu descobridor), que indica a presença da moléstia. Vários bacteriologistas sofreram reveses desse tipo. Além de Koch, Pasteur, Émile Roux e Paul Ehrlich tiveram graves contratempos em suas pesquisas. Mas Koch ficou abaladíssimo. Ele ansiava por um método eficiente para combater os micróbios. Fora seu sonho desde os tempos de médico de roça, em que via as pessoas morrerem de difteria e percebia quanto a medicina era impotente. Os trabalhos de Koch, no entanto, permitiram que outros cientistas, baseados em seus métodos, atinassem com maneiras eficientes de combater os bacilos que descobrira.
A curiosidade científica de Robert Koch não arrefeceu até os últimos dias, quando ainda trabalhava energicamente. Se algum admirador o incensava, erguia os olhos do microscópio e dizia: “Nada fiz de especial. Apenas trabalhei com afinco”. E voltava à sua tarefa, dizendo ainda “que a vida é curta e o trabalho é tanto”..
À 27 de maio de 1910 Robert Koch passou ao Oriente Eterno, da mesma forma que Pasteur, deixando a vida e entrando para a história da humanidade.