Após a separação da farmácia da medicina, esta última caiu na mais absurda e profunda estagnação, devido ao completo desconhecimento da química e da biologia e à ausência de quaisquer critérios de observação científicos por parte dos novos profissionais que surgiram com essa dissociação: os médicos, sendo que estes baseavam suas medicinas na autoridade dos “antigos, cultuados e venerados cientistas,” de cujos livros, bulas e sutras farmacológicas retiravam suas técnicas e tratamentos e, para se ter uma idéia da situação, basta apenas lembrar e descrever os suplícios do infeliz Príncipe Orsini, regente de um dos Reinos que compunham o território da península itálica, formado pela desagregação do Sacro Império Romano Germânico, atual República Federal da Itália, e que faleceu no ano de 1327 após cometer um erro fatal: após uma indisposição devido à algum prato do cardápio, ele, ao invés de repousar até cessar o mal, chamou os “médicos” que o rodeavam em sua corte e submeteu-se aos “homens da ciências” que o torturaram durante o resto da tarde e pela noite adentro com repetidas sangrias (As sangrias constituíam-se na técnica terapêutica mais utilizada naqueles tempos, sendo realizada ou por meio de incisões das veias cubitais ou pela utilização da sanguessuga - Hirudus medicinalis, sugava o sangue do “freguês”, extraindo-lhe os maus espíritos ou humores), e deram-lhe diversos purgantes e clisteres, tudo com o fito de extrair-lhe os “maus-humores”.
Seu pobre e maltratado estômago teve que aceitar substâncias tais como: urina de égua prenha enriquecida com ervas trituradas; pérolas dissolvidas em vinagre com uma pitada de pó de chifre de unicórnio africano; pó de asa de morcego em extrato de mandrágoras (extraídos na lua cheia); suco intestinal de basilisco com folhas de árvore Giab e muitos outros tratamentos “medicinais” do mesmo gênero.
Claro que o tratamento a que foi submetido o príncipe não era normal. Ele foi excepcionalmente bem tratado. Mandrágoras, árvores Giab, basiliscos e chifres de unicórnio eram importados de regiões remotas e, portanto, caríssimos. Contudo, ninguém jamais viu esses estranhos seres, e à exceção do unicórnio, que talvez fosse um rinoceronte, os demais eram provavelmente “fabricados” nos arredores de Roma. Aos menos favorecidos pela fortuna e que não podiam pagar esses caros remédios, deviam contentar-se com tratamento à base de víboras secas, pulmão de raposa e cabelos de enforcados, sendo esses medicamentos mais simples e menos fantasiosos. De toda essa absurda terapêutica sobreviveram algumas das muitas ervas utilizadas e que de fato apresentavam utilidades farmacológicas.
Não é sem provas que se acusa a medicina de ter se estagnado em tão pouco tempo de existência, basta ver que os médicos, ao se aliarem ao clero, renunciaram à sua liberdade de pensamento, sua capacidade de investigação e, acima de tudo, ao seu bom senso e ao seu espírito criativo e tiveram que aceitar toda a doutrinação católica que colocava o corpo como um santuário sagrado e inviolável e com isso, proibia terminantemente a prática da dissecação de cadáveres no aprendizado médico daquelas épocas sob pena de heresia, excomunhão e processo religioso e, ainda por cima, condenação aos suplícios por bruxaria sendo que por isso os médicos não possuíam os mesmos subsídios que os alquimistas, pois estes antecessores dos farmacêuticos modernos perambulavam pelos cemitérios à noite, profanavam túmulos, dissecavam cadáveres e os estudavam, mesmo estando cônscios do que lhes poderia suceder, caso descobertos pelas autoridades sacerdotais. Provas disso podem ser encontradas em qualquer livro texto sério de história geral (vide referências bibliográficas no final do texto), onde aparecem as atividades de diversos alquimistas, entre eles Paracelso, e ainda de gênios como Leonardo da Vinci.
A medicina apenas se tornou uma ciência séria e uma profissão confiável quando Mundinnus e André Vesálio conseguiram convencer os Papas de suas épocas, especialmente o Papa Sixto IV (1414-1484), e introduzir a prática da dissecação de cadáveres nas escolas de medicina do final da idade média, praticamente início da idade moderna, o que foi um escândalo naqueles tempos, pois, apesar da primeira dissecação ter acontecido em 1315, ela fora considerada ilícita pelo papa da época que a declarou imoral e herética, condenando seus praticantes à excomunhão por heresia. Até hoje a medicina vive dependurada nas outras ciências, tais como a farmácia, a genética, a imunologia, a bioquímica, etc., e o interessante é que a arrogância e o corporativismo da classe médica induzem os meios de comunicação a manipular as informações e a colocarem e veicularem ao público que as grandes descobertas que ocorrem são fruto de “pesquisas médicas”, sendo que não o são. Jamais um médico irá comunicar uma descoberta científica feita por um farmacêutico, atribuindo à este o mérito do descobrimento. Dirá, em primeiro plano que a descoberta foi feita por médicos. Basta ver o exemplo de Alexander Fleming, descobridor da Penicilina e que era farmacêutico, mas que aparece em tudo quanto é livro médico como se fosse formado em medicina. Aqui cabe uma inevitável e crucial pergunta: O que seria da medicina, em todos os tempos, se não fossem os farmacêuticos???
Enquanto a medicina começava a ser ensinada em escolas, primeiramente em Salerno e depois em Bolonha e em Montpellier, a Alquimia já era ensinada nas milenares Escolas Alquímicas, desde os tempos mais remotos da pré-história da humanidade.
Uma vez separada a medicina da farmácia, a psicologia, que ainda não era vista como uma ciência, acabou incorporada à primeira e passando a compor o que os médicos costumam chamar de “ato médico”, o qual, muitas vezes não passa de mera e espúria ingerência ou tentativa de gerenciamento médico das outras ciências, problema que até hoje vem causando dores-de-cabeça para todas as profissões da área da saúde, pois volta e meia o Conselho Federal de Medicina tenta baixar resolução alterando o conceito de “Ato Médico” e tentando trazer para si a fiscalização e a exclusividade do exercício da farmácia, da psicologia, da fisioterapia, da nutrição e até da odontologia, ignorando os direitos e prerrogativas desses profissionais, de forma ilegal, inconstitucional e indecente. Para não causar confusão, a história da psicologia após a separação da medicina da farmácia, prossegue em outra seção (História da Psicologia).